Há Quinta

Aparição

«Sento-me aqui nesta sala vazia e relembro. Uma lua quente de Verão entra pela varanda, ilumina uma jarra de flores sobre a mesa. Olho essa jarra, e escuto o indício de um rumor de vida, o sinal obscuro de uma memória de origens. No chão da velha casa a água da lua fascina-me. Tento, há quantos anos, vencer a dureza dos dias, das ideias solidificadas, a espessura dos hábitos, que me constrange e tranquiliza. Tento descobrir a face última das coisas e ler aí a minha verdade perfeita Mas tudo esquece tão cedo, tudo é tão cedo inacessível. Nesta casa enorme e deserta, nesta noite ofegante, neste silêncio de estalactites, a lua sabe a minha voz primordial.» FERREIRA, Vergílio - Aparição. Bertrand , 2003. ISBN 972-25-0251-4

Um frango


Antes de assimilar o que me dizia, olhei-a e percebi que era uma das galinhas que tinha viajado comigo. «Sabem, eu acho que não é hoje que almoçamos. Acho que só voltamos a comer quando nos derem ordem de soltura para podermos ir bicar por aí, e isso só quando este “circo” terminar. Pelo que percebi, o galo delegou no franganote e responsabilidade do sector masculino, mas quer o pato quer a Xica deveriam auxiliá-lo, mas olhando para este espectáculo, parece que nem um nem o outro o fizeram.» Olhei o “circo” com mais atenção e reparei que no meio dos quereladores, estava efectivamente um frango, acabadinho de sair do estatuto de pinto. A galinha que nos interpelou, chamava-se Natália, e pelos vistos, embora tivesse chegado ao mesmo tempo que eu, conhecia relativamente bem a quinta, porque continuou a fazer a actualização das notícias. Sim, realmente o que poderia melhorar o meu dia? Mexericos! Também é outra das minhas coisas favoritas. Ao menos ficámos a perceber alguma da dinâmica aqui da coisa.

1 comentários:

Habitat-M disse...

Nem a quinta escapa aos mexericos, esses malandros açoites da moralidade.

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