Há Quinta

Aparição

«Sento-me aqui nesta sala vazia e relembro. Uma lua quente de Verão entra pela varanda, ilumina uma jarra de flores sobre a mesa. Olho essa jarra, e escuto o indício de um rumor de vida, o sinal obscuro de uma memória de origens. No chão da velha casa a água da lua fascina-me. Tento, há quantos anos, vencer a dureza dos dias, das ideias solidificadas, a espessura dos hábitos, que me constrange e tranquiliza. Tento descobrir a face última das coisas e ler aí a minha verdade perfeita Mas tudo esquece tão cedo, tudo é tão cedo inacessível. Nesta casa enorme e deserta, nesta noite ofegante, neste silêncio de estalactites, a lua sabe a minha voz primordial.» FERREIRA, Vergílio - Aparição. Bertrand , 2003. ISBN 972-25-0251-4

Encontros imediatos



Não sei muito bem como tudo se processou, mas foi como se uma mão invisível tivesse pegado em nós, e nos tivesse colocado nas filas, porque muito sinceramente não me lembro de como fui parar ao fim de uma delas. Fiquei um pouco assustada, e enquanto todos avançavam para as capoeiras, a mim deu-me para recuar, até onde pude, ou seja, até que choquei com algo. Não precisei de me voltar para saber o que era, aliás, quem era. Petrifiquei. Penso que ele devia estar à espera de uma reacção minha, e eu queria muito voltar-me, mas faltava-me a coragem. Estava tão embrenhada a fantasiar com ele, que estremeci ao som da sua voz, «volta para a fila!» e não é que voltei, o mais rápido que consegui. Já quase todos tinham entrado. Subi as escadas, que me levavam à minha nova vida.